O Ministério Público Federal (MPF) em Itaperuna (RJ) denunciou grupo de médicos e servidores públicos por fraudes no Sistema Único de Saúde (SUS) no município de Italva, no Noroeste Fluminense.
Foram acusadas 13 pessoas pelos crimes de estelionato qualificado e associação criminosa. Um dos denunciados é o gestor da Clínica Casa de Saúde Imaculada, o médico Ronald Faria Crespo, o Doutor Roninho, político conhecido na região. Só essa clínica alegou ter internado cerca de cinco mil pessoas em 2011, um terço da população da cidade, enquanto que a média de internação em outros 13 municípios da região foi de 10% no mesmo período. Os prejuízos causados pela quadrilha aos cofres públicos podem ultrapassar R$ 8 milhões.
O caso foi separado em três denúncias pelo MPF para viabilizar o andamento processual na Justiça, que já recebeu as acusações e aceitou o trabalho de busca e apreensão realizado em 2012 pela Polícia Civil. (Processos nº 0000061-62.2014.4.02.5112, nº 0000062-47.2014.4.02.5112 e nº 0000063-32.2014.4.02.5112).
A primeira acusação trata da dupla cobrança de partos. Mesmo com autorização do SUS, o hospital chegou a cobrar, em média, 800 reais de pacientes para realizar o procedimento. Pelo menos 68 casos foram confirmados. Já a segunda denúncia é da cobrança de procedimentos mais caros do que efetivamente foram realizados. A terceira acusação aponta fraudes na emissão de Autorização de Internação Hospitalar (AIH) – mecanismo pelo qual o SUS libera os recursos financeiros – até mesmo para pessoas mortas ou para tratamentos nunca realizados.
As fraudes ficam mais evidentes quando se comparam os números da Casa de Saúde Imaculada com hospitais similares em cidades vizinhas. Um procedimento nada comum, como o de liberação de aderências intestinais, teria sido realizado 334 vezes em 2011 pela quadrilha denunciada, enquanto que num outro hospital da região, a realização de tal procedimento nem chegou a ser requisitada ao SUS no mesmo ano.
Só o médico Alfredo Crespo Neto, parente do Doutor Roninho, foi o responsável pelo pedido de 28% de todas as AIHs em 2011 – 1.237 solicitações – na cidade. O detalhe é que Alfredo também acumulava um cargo na Central de Regulação na Secretaria Estadual de Saúde, setor responsável por autorizar as internações.
Outras fraudes também foram constatadas pelo MPF, desde a inexistência de prontuários para diversas internações – nos três primeiros meses de 2012, houve 1.079 AIHs e apenas 298 prontuários – até procedimentos sem o nome do paciente e divergência entre as causas para liberar um procedimento cirúrgico e os motivos que levaram o paciente à internação.
As razões de internação também evidenciaram as fraudes, como o fato de o hospital pedir autorização para 65 casos de pneumonia e não realizar nenhum pedido de raio X. A Clínica chegou a ter 51 casos de tratamento de doenças crônicas das vias áreas superiores para mulheres com idade abaixo de 41 anos, em idade de reprodução. Outro caso que chamou atenção foi a suposta internação de 71 mulheres por insuficiência cardíaca com idade abaixo de 50 anos, nada comum para esse grupo etário.
“Ao lesar o patrimônio destinado a custear a prestação do serviço público de saúde, não só se vislumbra a retirada de valores dos cofres públicos e consequentemente enriquecimento ilícito por parte de seus agentes, como também, e de forma automática, tem-se piora na qualidade de atendimento à população carente de recursos – maioria no nosso país – e que necessita de amparo, merecendo dupla reprovação”, lamenta o procurador da República Cláudio Chequer, autor das denúncias.
Pedidos
O MPF pede a condenação dos 13 envolvidos pelos crimes de estelionato qualificado e associação criminosa. Cinco aparecem nas três denúncias: Doutor Roninho, Alfredo Crespo, Neuza Maria de Freitas Borges, Camila Louvaim Cândido e André Luiz Pereira de Souza. Três pessoas configuram em duas denúncias: José Carlos Rosa, Ângelo Vianna Lorenzini e Ana Cristina Franco de Souza Carvalho. Já os cinco restantes aparecem apenas na terceira acusação: Tiago Costa Correa, Maurício da Silva Santos, Jamil Figueiral Ribeiro, Francisco de Assis Oliveira Neto e Camila Toledo de Souza.
Para o MPF, “o grupo já demonstrou forte vínculo e constituição com nítida intenção de enriquecimento ilícito e fraude ao SUS”. Exemplo disso é a continuidade e a reiteração da prática criminosa. Como exemplo, nas três acusações, o médico Ronald Faria Crespo é apontado em pelo menos em 120 ocorrências (67 na primeira denúncia; 30 na segunda e 28 na terceira). Pelo crime estelionato qualificado, para cada caso comprovado, a pena máxima prevista é de seis anos e oito meses de prisão. Já para associação criminosa, a pena é de três anos.
Fonte: Assessoria de Comunicação Social/Procuradoria da República no Estado do Rio de Janeiro